Folha 8 – edição de 28 junho 2013
O membro do Conselho de Estado Português, ex-líder do PSD e comentador da SIC, Luís Marques Mendes, defendeu, em Luanda, que a diversificação, sustentabilidade e qualificação são os principais desafios para Angola, considerando a “economia do conhecimento” a mais importante aposta para o sucesso do país. É claro que Marques Mendes poderia, se não fosse também um político flutuante, dizer mais algumas coisas úteis que, no entanto, desagradariam ao poder instituído em Angola, embora fossem úteis para os angolanos.
O mediático comentador da SIC, que esteve em representação da Abreu Advogados (empresa de que é consultor e que tem parcerias com sociedades de advogados em Angola, Brasil, Macau, Moçambique e Timor-Leste), foi orador do tema “Diversificação Económica e Sustentabilidade da Economia de Angola”, e considerou “excelente” a iniciativa dos empresários angolanos, realçando que permitiu “bons debates”.
De acordo com Luís Marques Mendes, na mesma linha do seu “colega” da SIC, Henrique Cymerman que, com a entrevista a Eduardo dos Santos é um sério candidato ao Prémio Pulitzer, Angola tem sido “um caso de sucesso” pelos bons resultados que tem alcançado desde o fim da guerra, há 11 anos, e para que assim siga no futuro precisa de apostar nas áreas da agricultura, alimentação, turismo, energia e águas, para diversificar a sua economia.
Para dar maior sustentabilidade à sua tese e para que não restassem dúvidas, Marques Mendes citou mesmo o ministro angolano da Economia. É obra. Para Luís Marques Mendes, a sustentabilidade nas dimensões económica, social e ambiental são igualmente apostas para Angola, que podem ser alcançadas através da criação de riquezas, da diminuição de desigualdades sociais e da preservação do ambiente. No entanto, segundo a sua abalizada tese, a aposta nas qualificações, que é “a questão mais importante de todas”, deve ser decisiva para o futuro do país. Nessa aspiração, Angola pode contar com a contribuição de Portugal, tendo em conta que as relações hoje entre os dois países não são mais de concorrência, mas sim de complementaridade, realçou Luís Marques Mendes. Ou seja, Angola entra com o dinheiro e Portugal com a experiência para que, amanhã, os angolanos fiquem com a experiência e os portugueses com o dinheiro.
“Portugal tem dificuldade, por força da crise, em ter investimento. Os angolanos podem cada vez mais investir em Portugal, mas Angola tem um défice de quadros, nós temos um excesso de quadros por força da crise, de pessoas bem qualificadas, que podem vir dar um contributo importante para Angola”, frisou o discípulo político de Cavaco Silva. “Ou seja, acrescentou Marques Mendes, complementaridade que constitui um manancial de oportunidades para Angola e para Portugal”. E se o ex-secretário de Estado adjunto do ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares do X Governo (1985-1987); secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, no XI Governo (1987-1992); ministro- adjunto do Primeiro-Ministro do XII Governo (1992-1995); ministro dos Assuntos Parlamentares, no XV Governo (2002-2004) e porta-voz nos Governos de Cavaco Silva o diz, é mesmo para levar a sério.
Por sua vez, o ministro da Economia, Abraão Gourgel, apontou a necessidade da criação de sectores complementares ao sector petrolífero, nomeadamente a indústria e a agricultura. “É mais fácil para um país importar do que produzir. O retorno é mais imediato, não se exigem empregos qualificados e é uma situação também benéfica para os países e empresas exportadoras, mas nunca para o país importador, razão pela qual devemos inverter o quadro”, disse o ministro angolano na abertura do I Fórum Nacional Empresarial, promovido pelo LIDE Angola.
Do ponto de vista da coerência, sendo que esta é uma qualidade marginal na vida política portuguesa e angolana, Luís Marques Mendes poderia ter defendido, como fez em relação aos ex-governantes socialistas do Executivo de José Sócrates, que muitos dos governantes angolanos deviam estar a ser julgados pela “gestão danosa de orçamentos” e pelo “caminho de ligeireza e irresponsabilidade”. Mas não. Aliás, também a memória é coisa de somenos importância na vida política. Se o não fosse, talvez Marques Mendes defendesse, no seu país, a retroactividade dessa responsabilização criminal, não até ao D. Afonso Henriques, mas, certamente, até ao cavalheiro que foi primeiro-ministro de 6 de Novembro de 1985 a 28 de Outubro de 1995, presidente da República eleito em 22 de Janeiro de 2006 e reeleito em 23 de Janeiro de 2011. Aliás, apenas como matéria para discussão académica, registe-se que Marques Mendes defendeu, sem apontar nomes, que “muitos ex-governantes com ares sorridentes no Parlamento deviam estar a ser julgados”, já que “não chega a responsabilização política” para situações como a “gestão danosa de orçamentos”. Aliás, ainda hoje tem razão.
Mas em matéria de gestão danosa da “coisa” pública o julgamento só se aplicará ao PS? Na bancada mais ao lado, a do PSD, não haverá tantos telhados de vidro como na do PS? E quanto ao MPLA, partido-irmão do PS às segundas, quartas e sextas e do PSD às terças, quintas e sábados?
Marques Mendes gosta de dizer que muitos socialistas deviam ter “vergonha” pelo “caminho de ligeireza e irresponsabilidade” que levou Portugal para a situação de protectorado de Angola.
Em matéria de falta de vergonha, Portugal está nos primeiros lugares do ranking mundial. E, se calhar, do ponto de vista interno, o PS e o PSD estão empatados. Por isso, no que respeita ao processo de bajulação ao regime angolano, é tudo fuba do mesmo saco.
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