André Catueira, da agência Lusa
Machaze, Moçambique, 28 set (Lusa) - Em Machaze, Manica, centro de Moçambique, a prática comum da poligamia está a tornar-se numa "arma fértil" para a propagação do HIV-SIDA num distrito fornecedor de mineiros para a África do Sul, disse à Lusa fonte medica.
Um exemplo dessa situação é a pacata localidade de Mavonde, com 6.230 habitantes e uma prevalência de HIV/SIDA entre a população adulta calculada em 60 a 65 por cento, quatro vezes maior do que a média nacional.
"A poligamia é um princípio cultural em Machaze. Há homens com até seis mulheres e isso avoluma o ciclo de transmissão do vírus, sobretudo entre mineiros, que apenas regressam a casa uma vez por ano para engravidar as suas esposas" disse Leonor Arnaldo, enfermeira chefe de Mavonde.
Muitos mineiros moçambicanos frequentam prostitutas na África do Sul, disse, e de regresso a casa a "prova de fidelidade" para com a esposa é "fazer sexo sem preservativo", mesmo sabendo do seu estado de saúde, situação que se reflete nas estatísticas.
Em 2011, das 54 pessoas submetidas ao teste de HIV no centro de saúde de Mavonde 25 resultaram positivas. No ano passado, todos os testes foram invalidados, por erros de colheita de amostras.
Já em 2013, das 14 pessoas submetidas ao teste, em maio último, nove tiveram resultado positivo, a média que prevaleceu até agosto, indicam dados do centro de saúde de Mavonde.
"Geralmente as mulheres grávidas são submetidas ao teste de HIV/SIDA, e, quando dá positivo, escondem o resultado, pois têm dificuldades de o apresentar por receio de divórcio ou violência física, acusadas de levar o vírus para dentro de casa" explicou Leonor Arnaldo.
Uma estrada estreita de areia branca conduz à casa de Zacarias Mathepsua, um curandeiro "sem idade", com seis mulheres, 21 filhos e cerca de 30 netos.
"Eu já nasci no seio de uma família alargada, e cumprindo a tradição sigo o mesmo caminho da poligamia, com a mesma sabedoria", declarou Zacarias Mathepsua, um famoso curandeiro da região, que perdeu as contas da sua idade e do seu agregado.
O Plano Estratégico Nacional de combate ao HIV/SIDA, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Combate a SIDA (CNCS) em Moçambique alia a pobreza como um dos fatores de risco para a infeção pelo HIV.
O problema piora pelo facto de as viúvas serem esquecidas em vários aspetos relativos ao direito de sucessão, herança e transmissão de bens, além de serem menosprezadas em práticas socioculturais nas suas comunidades.
"O meu marido morreu por várias complicações, mas deixou-me muitos filhos, além de ter que cuidar de filhos de outras duas mulheres, mas eu não tenho estrutura económica para aguentar uma família grande", Joana Sibanda, 28 anos, que pedala 20 quilómetros diariamente em busca de água para vender.
Um relatório de 2008 do Instituto Nacional de Estatísticas (INE) sobre o estado civil em Moçambique, concluiu que as mulheres casam mais cedo do que os homens, facto que pode estar aliado à existência no país de muitas viúvas jovens.
Segundo os dados do INE, em Moçambique a idade média de casamento nas mulheres é de 20,3 anos e nos homens é de 24,9 anos. No entanto, nas zonas urbanas, estes valores são algo superiores àqueles que se verificam na zona rural: 22,3 anos para as mulheres e 27,2 anos para os homens contra 19,3 e 23,7 anos, respetivamente.
AYAC // VM - Lusa
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