Eduardo Oliveira Silva - Jornal i, opinião
Se Machete se demitisse daria uma prova de lealdade a Pedro Passos Coelho
Começa a ser um tema recorrente e até aborrecido, mas é inevitável abordá-lo de novo. Trata-se da situação de Rui Machete, actualmente ainda ministro dos Negócios Estrangeiros.
Não interessa a definição: mentira, falta à verdade, omissão, inverdade, esquecimento, etc. O facto é que parte do que o ministro dos Negócios Estrangeiros disse quando foi interrogado sobre a sua relação com a SLN-BPN não bate certo.
E assim sendo não é menos certo que o ministro Rui Machete está fragilizado, prejudicando o cumprimento das suas altas funções. Inicialmente ainda se podia dar o desconto, mas o conhecimento regular de novos factos torna a situação do ministro tão complicada ou mais que a da sua colega das Finanças, que ironicamente também é ministra de Estado.
Como Passos Coelho jamais o demitirá e Portas deixará correr o problema, que está no quintal do vizinho, o melhor seria Machete perceber que a sua demissão facilitaria a vida ao primeiro-ministro, sendo uma prova de lealdade pessoal e política. Mas essa perspectiva, pelo menos até surgirem eventualmente novos factos desagradáveis, está afastada, pois Rui Machete está agarrado ao lugar como a lapa à rocha.
Machete cresceu e desenvolveu-se politicamente numa época em que a luta ideológica e jornalística ganhava lugar à investigação factual das circunstâncias, em que os meios de investigação eram limitados e em que havia uma espécie de pacto de não confundir a vida política com interesses privados.
Felizmente o mundo mudou. Apenas alguns aspectos da vida privada ou íntima se mantêm ainda sob reserva, mas, tirando isso, hoje está tudo em todo o lado e declarações feitas há anos tramam anónimos por meros pecadilhos, quanto mais políticos que chegaram a situações relevantíssimas.
E aí de duas uma: ou quem disse e fez algo repreensível sai ao ser denunciado quando se trata de vida pública, ou então, quando são casos de vida privada, assume e aguenta as suas circunstâncias.
No caso de Machete está em causa a natureza da sua relação com uma bicéfala instituição chamada SLN e BPN.
Ora o desabamento desse grupo constituiu o maior sorvedouro de dinheiro público de que há memória em Portugal (tirando talvez o Convento de Mafra, que mesmo assim tem a gigantesca vantagem de existir de pedra e cal e de ser um motivo de orgulho nacional).
A relação que Rui Machete manteve com a organização deveria tê-lo levado a recusar entrar para o governo. Como não o fez, optando pelo regresso à vida pública, tem agora de sujeitar-se aos tempos modernos, aos mecanismos de investigação disponíveis e ao combate político implacável que o Bloco de Esquerda lhe move, sobretudo depois de ter descoberto que foi factualmente incorrecta a sua declaração em que omitia à Assembleia da República que tinha sido accionista do grupo, o que é grave.
No momento em que tanto se fala nos mercados e no escrutínio que fazem de Portugal, é legítimo interrogarmo-nos sobre o efeito que têm situações como a de Machete e a de Maria Luís Albuquerque, que não são anónimos sem influência.
Fingir que estes casos não têm repercussão negativa é negar uma realidade evidente.
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