Sunday, October 6, 2013

Angola: Corrupção tornou-se numa instituição para os ricos com protecção judicial

 


Folha 8 – Edição 1160 – 28 setembro 2013
 
Essa peregrina e ingénua ideia de querer pôr, em Angola, os corruptos a lutar contra a corrupção é digna de qualquer ditadura que se preze. E o caso. Faz parte dos livros e dos pilares de todos os países, embora mais de uns do que de outros. Também nisto o regime deles, que infelizmente nos obrigam a que seja de todos nós, está no top.
 
Dizer, como faz o regime, que o combate à corrupção em Angola apresenta resultados baixos apesar da luta encetada, até tem piada, sobretudo para os que têm a barriga cheia. Apesar dos "esforços" (sejamos benevolentes), traduzidos na produção de legislação de um Parlamento esmagadoramente dominado pelo MPLA, muitas dessas leis estão viciadas à nascença, com graves defeitos de concepção e formatação, o que as torna, como está na génese dos seus feitores, ineficazes. Aliás a ineficácia é fundamental para se ter boas leis que permitam ter bons corruptos. Corruptos legalmente protegidos pelas leis e pelas práticas que constituem o seu modo de vida, o seu status quo.
 
O combate (desculpem o exagero do termo) à corrupção está enfraquecido, ou nem existe, por uma série de deficiências estratégicas resultantes da opção, igualmente estratégica, de tapar o sol com uma peneira de modo a que na rede sejam apanhadas as petingas mas nunca os tubarões.
 
São de facto as deficiências estratégicas que permitem e que estimulam a que, à boa maneira mafiosa, a corrupção medre e domine um reino esclavagista que é dominado por novos colonizadores que, como se sabe, não se limitaram - com a independência - a copiar o que havia de pior nos seus antecessores. Conseguiram o feito de piorar ainda mais o que já de si era mau.
 
Certo é que no pós-independência, os diferentes (mas sempre iguais) governos do MPLA nunca estabeleceram, objectivamente, uma política de combate à corrupção, limitando-se apenas a enumerar um conjunto de considerandos vagos e de intenções simbólicas para enganar o Povo e dar, para o exterior, a imagem daquilo que não é - um país sério.
 
Mas do que é que estávamos à espera? Que os corruptos lutassem contra a corrupção que, aliás, é uma das suas mais importantes mais-valias? Por alguma coisa Angola tem um Presidente da República, simultaneamente Presidente do MPLA e do Governo que faz da mentira uma arma de destruição maciça.
 
As iniciativas legislativas, formalmente típicas dos Estados de Direito, não têm travado a corrupção, nem têm permitido o destaque desde fenómeno na comunicação social (com excepção do Folha 8), nem têm alterado a percepção dos organismos independentes sobre a incidência e extensão da corrupção na sociedade que domina o nosso país.
 
É claro que aqui também entra a fraca ou nula capacidade, tanto da comunicação social como da sociedade civil, para acompanhar os processos de produção de legislação e denunciar a má qualidade dos deputados e dos que ocupam cargos de responsabilidade nas instituições públicas, a começar na Presidência da República. Na nossa política, literalmente dominada pela máquina do regime do MPLA, existe unia total irresponsabilidade dos eleitos face aos eleitores, sendo as promessas de combate à corrupção uma mera forma de entreter um Povo faminto e doente.
 
Somados, estes factores resultam (como se isso interessasse a alguém) na falta de honestidade para com os cidadãos e na ausência de sancionamento real das irregularidades praticadas pelos políticos. Para acabar com esta realidade, os Estados democráticos defende urna maior fiscalização da parte do Parlamento (também ele o alfobre da corrupção) aos registos de interesses de deputados e membros do Governo, bem como o alargamento do regime de incompatibilidades aos membros que integram os gabinetes governamentais. E claro que isto não se aplica a um país que, segunda o seu Presidente, foi obrigado a dizer que era uma democracia. De vez em quando os angolanos, seja por via directa ou não, resolvem falar de corrupção. Quase sempre, neste como em outros assuntos, apenas mudam as moscas... O Povo cala e consente, a troco de um prato de fuba.
 
Nós os angolanos somos, na generalidade e em teoria, contra a corrupção, mas no dia-a-dia acabamos por pactuar com ela porque é preciso sobreviver. E entre ser impoluto de barriga vazia e corrupto com ela cheia, venha o escolhido de Deus e... escolha. Ao nível simbólico, abstracto, toda a gente condena a corrupção, mas no nível estratégico, no quotidiano, as pessoas acabam por pactuar com a corrupção, até nos casos mais graves, de suborno.
 
Não sabemos o que se chamará ao facto de quando alguém se candidata a um emprego lhe perguntarem se é do MPLA. Será corrupção? E quando dizem que "se fosse filiada no MPLA teria mais possibilidades"? Ou quando se abrem concursos para cumprir a lei e já se sabe à partida que quem vai ocupar o lugar é o afilhado do general ou o primo do ministro?
 
A estrutura de poder actual em Angola é, basicamente, a estrutura de poder de Oliveira Sala7ar. É uma estrutura que, na sua génese, se mantém e asfixia todos os que contra ela lutam. E enquanto assim for, e assim é desde 1975, os grandes interesses ficam na mão do clã divino do querido líder. Afirmar que os assustadores níveis de corrupção existentes em Angola superam tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizações internacionais e nacionais credíveis, é uma verdade que por ser tão visível se torna quase sempre invisível.
 
Aliás, basta ver como os políticos e as grandes empresas, portuguesas e muitas outras, investem forte no clã Eduardo dos Santos corno forma de fazerem chorudos negócios... Até com a venda limpa-neves para Luanda.
 
Com este cenário, alguém se atreverá a dizer ao dono do poder angolano, José Eduardo dos Santos, que é preciso acabar com a corrupção? Alguém se atreverá a dizer-lhe que ou Angola acaba com a corrupção ou a corrupção acaba com Angola?
 
Cremos, contudo, que a corrupção é de facto a Pedra Filosofal do nosso país. Isto porque, sobejam os exemplos, é muito mais fácil negociar com regimes corruptos do que com regimes democráticos e sérios.
 
Por alguma razão, sendo Angola o sexto maior fornecedor petrolífero dos Estados Unidos da América, ninguém verá a Administração Obama a olhar para os caixotes do lixo de Luanda dos quais se alimentam muitos e muitos angolanos.
 
Sendo que o caminho certo se define não em função da luta contra a corrupção mas, é claro, dos interesses económicos, o regime só tem que continuar como está ou, se possível, aumentar os níveis.
 

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