Friday, October 18, 2013

Moçambique: MORRER COM UMA RECEITA NAS MÃOS

 

Verdade (mz) - editorial
 
É a triste sina dos moçambicanos nos dias que correm. Não há medicamentos e as pessoas estão entregues à sua própria sorte. Falta tudo. É um mal geral em todo o país. As farmácias estatais, hospitais, postos e centros de saúde não têm medicamentos. Paradoxalmente, as farmácias privadas, onde comprar custa muito dinheiro, têm tudo o que se procura. Num país acostumado a urdir esquemas no esgoto da sacanice é preciso desconfiar. Contudo, o mais perigoso é o silêncio cúmplice da imprensa. E aqui, diga-se, não escapa nenhum órgão de informação. Estão todos na mesma panela.
 
O que faz correr a imprensa é o escândalo e não o bem-estar dos moçambicanos. E isso é extremamente mau para as nossas necessidades colectivas. Damos mais importância a um pretenso caso de corrupção, mas viramos os olhos para o lado quando o país é açoitado por uma calamidade natural. Não há antirretrovirais e ninguém diz nada. Estamos aqui à espera de um incidente político ou que a Renamo dispare uns quantos tiros em Sathunjira. A falta de medicamentos é pouca coisa. Não há tiros, mas há muito mais mortos. Anónimos, sim, mas resultam desse nosso silêncio repugnante.
 
Um país de cidadãos dignos e no qual a cidadania é um valor supremo o ser humano não morre açoitado pelo silêncio de 22 milhões de cúmplices. Nós, sem excepção, somos culpados desta “carnificina”. O nosso maior problema enquanto moçambicanos reside no descaso em relação ao outro. Enquanto o estado de coisas não mexer com o nosso mundinho, não tocar no nosso carro topo de gama e continuarmos a ser assistidos em clínicas privadas, os moçambicanos deste extenso país podem morrer. Não importa. Só nos importamos com o escândalo imediato.
 
Mas é complicado dizer a alguém que come o que lhe dá na gana que há milhões de outros compatriotas a morrer à fome e/ou de doenças curáveis. Ninguém quer saber dos Iciduas da vida ou da falta de água em Chigubo. Isso não vende e nem causa repulsa. Interessa mais a corrupção de um punhado de gente do que as condições de sobrevivência da maioria.
 
Este foi, pois, muito mais do que um editorial, um lamento. O mundo, infelizmente, continua a ser um lugar preferencialmente para biltres e para bestas. No Moçambique de hoje, ser solidário, olhar para o próximo, partilhar e sacrificar-se pelo bem comum, não é importante. E não o é porque, salvo raras excepções, este país transformou-se no ninho de gente sem escrúpulos, para cobardes, para incultos, para fanáticos. Dificilmente a solidariedade teria lugar no meio de tanto lixo...
 

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